sexta-feira, 10 de abril de 2020
Tênebras de vulga esperança,
O que nos espera amanhã?
Se as pragas do tempo levam a criança
As lágrimas do velho, o derradeiro afã
Passeia pelos ares, o delírio da morte
Eflúvio de espectro... a desolação
Como náufragos à própria sorte
A esperança impele a alma... Frágil cordão!
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domingo, 2 de fevereiro de 2020
Reflexões filosóficas
Caráter
Atualmente, é espantosa a tendência humana para vulgaridade. Odiamos o próximo como regra, e, amiúde, tratamos as pessoas que amamos com um desprezo digno de nossos piores inimigos - talvez para compensar a distância deles... É como se a proximidade e a intimidade fossem um salvo-conduto para a imposição de sofrimentos. Não se exita - após as discordâncias mais sem importância - em buscar no fundo da alma e de uma maneira quase inconsciente aquilo que a pessoa alvo mais odeia ou aquilo que mais a magoaria, para, após, se proceder à prática sutil, velada... sem se importar com consequências e sem lembrar que o alvo pode ser uma das únicas pessoas do mundo que te ama de verdade. Não importa! Nada importa, senão satisfazer o desejo egoístico de vingança! Assim é o vulgar amor dos tempos modernos.Sou uma das vítimas disso.
Sempre possuí, de forma quase inata, uma verve - uma inspiração, pode-se dizer - de buscar e praticar aquilo que denomino de amor transcendental e, de forma previsível, minhas perquirições no mundo real me levaram ao nada... (talvez a isso eu deva meus dotes poéticos, sendo meus escritos pautados na idealização de uma amor cândido, perene, intangível...).
De todo modo, ainda acredito no amor. Não posso dizer que ele não existe - isso seria contradizer minha própria inspiração e índole no mundo real. Mas os que são mais idealistas nesse sentido são os que mais sofrem...
Observo, não sem íntimo espanto, a volatilidade das relações humanas - pautadas mormente em um tácito jogo de interesses obscuros em que as aspirações mais mesquinhas definem o andamento das coisas. "O que você tem para oferecer?" é a questão, e não mais "O que você é?". "Você me ama?" é a preocupação, ao invés de "Como eu estou amando?". Essa é a normalidade, a qual se desvela corriqueira e banal.
Ora, "amor verdadeiro" não se confunde com "amor incondicional". O verdadeiro é justamente aquele que não foi maculado por uma infidelidade, por uma vingança, pelo desprezo. Metafísico, nesse sentido.
É, de certo modo, triste - e assustador - o comportamento mediano atual: aceita-se tudo do ponto de vista (i) moral, mas não se aceita os defeitos mais inofensivos; aceita-se tudo o que você quer, mas nada que o outro quer; do amor para o ódio, e do ódio para o amor sem qualquer reflexão - bestialidade digna das feras. Quanto mais você faz, mais tem de fazer, senão jamais será bom o suficiente.
Assim como coragem é, do ponto de viés aristotélico, fazer, na solidão, aquilo que você faria perante uma multidão, o caráter segue lógica semelhante: o caráter virtuoso requer a prática constante do sacrifício e da fidelidade, no âmbito solitário das ideias. Trata-se do principal requisito para o amor verdadeiro.
É quando reflito nessas coisas que percebo o quanto sou solitário...
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sábado, 1 de fevereiro de 2020
Reflexões filosóficas
Decepção...
Infelizmente, tenho o péssimo hábito - ou, mais propriamente, característica psicológica - de projetar nas pessoas de meu trato pessoal expectativas diretamente proporcionais ao meu nível de moralidade. Dizendo de outro modo, talvez eu seja uma pessoa demasiadamente ingênua: tenho a tendência de acreditar que não farão comigo aquilo que eu jamais faria com outrem.
Nesse viés sou profundamente propenso a frustrações e decepções... Se por um lado, meu caráter me impele a pensamentos de justiça e profunda fidelidade à convicções - e pessoas -, nem sempre estou preparado para enfrentar os corriqueiros golpes inerentes a forma mesquinha e egoísta de agir e pensar dessas outras pessoas - as quais amiúde portam nada mais do que a moralidade ordinária, comum à maioria...
Não sei se esse meu aspecto idealista é uma virtude ou uma maldição - mas é inegável a propriedade que esse estranho apanágio tem de me afastar das outras pessoas: enquanto minha conduta na vida real pauta-se em meu idealismo - composto de profundos sentimentos de verdade e sinceridade - por vezes sou golpeado e digamos, magoado, com o egoísmo alheio (amiúde, dos mais próximas...), o que não contribui para minorar minha misantropia, tornando-me cada vez mais arredio.
Essa experiência transcendental - leia-se, real - envolvendo amor e lealdade - é, obviamente, uma utopia... entretanto, a busca é perene, e eu ainda espero o melhor das pessoas (essa, minha principal fonte de tristeza...).
Certas vivências em relações pessoais me incomodam e entristecem, sobretudo quando envolvem provocações e, posso dizer, "ataques" dos tipos os quais eu jamais faria. Meu caráter me impede de aceitar e inclusive, conviver, com qualquer suspeita de infidelidade, mesmo que uma infidelidade praticada no âmbito das ideias... Atônito e decepcionado, resguardo-me no silêncio. Essa sempre foi minha única reação.
A cerne destas minhas desventuras não remontam nas ações das pessoas tomadas isoladamente (ad exemplum, minha suposta nam...) mas sua intenção: e eu sei quando querem me provocar. O mais que conseguem é decepção, e a perene quebra de confiança, a qual jamais será restaurada. E, enquanto isso, eu continuo em meu quase doentio heroísmo, almejando sempre buscar o melhor para as pessoas que amo, mesmo que elas não tenham a sensibilidade necessária para atribuir a isso o valor necessário.
Essa é a minha solidão: baseada em um deslocamento entre a expectativa (baseada na virtude) e a realidade. Uma alma deslocada em relação a um mundo egoísta, coletivista e baseado na satisfação imediata de desejos pessoais, suplantando toda e qualquer objetivo metafísico.
Espero um dia entender o porquê desse suposto talento de entender o mundo e de ler as pessoas, sendo que, ao mesmo tempo, não consigo participar de suas comuns aspirações. Mas, enquanto isso, sou apenas mais um decepcionado, buscando alguma verdade e algum resquício de sentimento verdadeiro.
sexta-feira, 31 de janeiro de 2020
Controle
Desejos viciadosAtirados no abismo dos olhares perdidos
Na multidão - nós estamos mais sozinhos
Sua face aprisionada em uma tela de TV
Já sabemos quem é você...
Nós já sabemos o que é você
O sistema não barganha com escravos
O sistema não barganha com escravos
Mentiras cuspidas
Vermes atirados ao chão
Na fila da morte - você é a solidão
Força invisível - intimidação ostensiva
Já sabemos quem é você...
Você não é mais você
O sistema não barganha com escravos
O sistema não barganha com escravos
Doenças espalhadas
Pelos que vendem a cura
A caneta que apela é a faca que te fura!
Biometria infalível
Teia, a vida, a prisão!
Já sabemos quem é você...
Você não é mais você
O sistema não barganha com escravos!
O sistema não barganha com escravos!
O sistema não barganha!
O sistema não barganha!
quinta-feira, 30 de janeiro de 2020
sexta-feira, 3 de janeiro de 2020
Crônicas da Casa Vazia
O abismo do tempo
(Parte 1)
Como devoto da música dos ventos das derradeiras tardes de inverno, o velho capataz contemplava, no limiar do bosque, o ulular inconstante decorrente da pertinaz avença entre a viração e as folhas das árvores altivas. Dentre o lusco-fusco daquele final de tarde, não distinguiam-se as longas barbas daquele vetusto trabalhador campesino com os densos liquens que encobriam a relva. Os torpes raios de sol bruxuleavam languidamente, ensaiando um adeus e convidando a escuridão que se aproximava. Podia imaginar, o campesino, que o badalar do sino do campanário da antiga igreja do longínquo vilarejo marcavam a hora do Angelus, mas as horas já não importavam naqueles rincões.
Um suspiro e um passar de olhos a volta selaram o instante de meditação: ainda havia trabalho a fazer. Em um ímpeto o trabalhador recolheu restos de madeiras secas que o circundava, ajeitando-as em seu saco de sarapilheira, não antes sem notar o curioso aspecto das densas e obscuras nuvens que se aproximavam no, até então, plácido horizonte. Se a experiência já o alijou de todos os medos, também o ensinou a respeitar um sinal da natureza - esta, capaz das maiores sutilezas e canduras, mas também das mais titânicas assombrações...
Um suspiro e um passar de olhos a volta selaram o instante de meditação: ainda havia trabalho a fazer. Em um ímpeto o trabalhador recolheu restos de madeiras secas que o circundava, ajeitando-as em seu saco de sarapilheira, não antes sem notar o curioso aspecto das densas e obscuras nuvens que se aproximavam no, até então, plácido horizonte. Se a experiência já o alijou de todos os medos, também o ensinou a respeitar um sinal da natureza - esta, capaz das maiores sutilezas e canduras, mas também das mais titânicas assombrações...
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